Depois de, com muito esforço, me adaptar à escola primária, permaneci ansiosa e introvertida.
Sempre fui a melhor aluna da turma e estudar e ter boas notas foi a minha maneira de controlar um ambiente que me era desconfortável. Não via mais ninguém com a minha insegurança, nem a achar que os outros meninos eram extremamente infantis, por isso o que para mim era divertido era estudar, fazer fichas, desenhar e ter 20 a todas as disciplinas. Quando tinha 19 a matemática, já achava um drama.
Odiava as festas da escola, o carnaval e tudo o que me evidenciasse. O que nunca pensei foi que, com as notas que tinha, isso me poderia trazer para as luzes da ribalta, como aconteceu com alguns prémios que recebi e primeiras páginas no jornal, algo que felizmente já ninguém se lembra.
Quando passei para um colégio, no 5º ano, mais deslocada me senti. Era sem dúvida uma introvertida e o mundo não estava preparado para isso, aliás, ainda não está. O orçamento não dava para estar vestida de marcas dos pés à cabeça e nem tinham sido esses os valores que me tinham incutido. Estava num colégio pela qualidade do ensino, mas a sociabilização foi difícil. Excetuando uma amiga que ainda hoje mantenho, não me identificava muito com ninguém. Fui-me adaptando, tendo amigos, mas cada vez mais me resguardava no meu mundo, com receio de julgamentos e falta de identificação com os outros.
Nunca deixei de ser quem era, simplesmente não partilhava. Com catorze anos morreu o meu avô materno, com quem também vivia, e não o exteriorizei. Esta dor profunda veio resultar nos meus primeiros ataques de pânico e esgotamento nos primeiros anos da faculdade. Atribuía os ataques de pânico a todas as situações menos a esta e vi-me pela primeira vez de cama dois meses sem forças sequer para respirar. Via a preto e branco literalmente, não conseguia levantar-me sozinha. Fui medicada, mas não fui tratada. A única pessoa que sabia avaliar bem o que estava a passar era a minha mãe, que também passou toda a vida a lutar contra a ansiedade profunda.
A medicação foi mágica e fiquei totalmente sem sintomas, prontíssima para regressar em grande à faculdade, recuperar tudo o que tinha perdido e ler num fim de semana a Ilíada, Odisseia e Eneida de uma assentada. Na faculdade de letras as notas altas eram baixas para mim. Ter um 14 era maravilhoso, porque havia professores que não davam notas mais altas que isso, mas consumia-me não ter mais, estudasse o que estudasse.
Adorei o curso de Línguas e Literaturas Modernas, que toda a gente me dizia que não servia para nada e que não iria ter futuro. A par sempre estudei psicologia, primeiro com o apoio de uma professora, depois de forma autodidata. Sempre foi uma paixão. Seguiram-se as terapias alternativas.
Pelo meio, exames na faculdade com muitas crises de ansiedade a interferir. Sentia-me diferente e sentia que a vida era bastante mais difícil para mim. Havia dias em que a ansiedade estava no centro de tudo e fui arranjando mecanismos para a contornar. Mal sabia eu que o problema continuava lá …